domingo, 19 de junho de 2011

Os Estatutos do Homem
Thiago de Mello


Artigo I.

Fica decretado que agora vale a verdade.
Agora vale a vida,
e de mãos dadas,
marcharemos todos pela vida verdadeira.


Artigo II.

Fica decretado que todos os dias da semana,
inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
têm direito a converter-se em manhãs de domingo


Artigo III.

Fica decretado que, a partir deste instante, haverá girassóis
em todas as janelas, que os girassóis terão direito a abrir-se dentro da sombra; e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,


abertas para o verde onde cresce a esperança.


Artigo IV.

Fica decretado que o homem
não precisará nunca mais
duvidar do homem.
Que o homem confiará no homem
como a palmeira confia no vento,
como o vento confia no ar,
como o ar confia no campo azul do céu.


Parágrafo único:

O homem, confiará no homem
como um menino confia em outro menino.


Artigo V.
Fica decretado que os homens
estão livres do jugo da mentira.
Nunca mais será preciso usar
a couraça do silêncio
nem a armadura de palavras.
O homem se sentará à mesa
com seu olhar limpo
porque a verdade passará a ser servida
antes da sobremesa.


Artigo VI.

Fica estabelecida, durante dez séculos,
a prática sonhada pelo profeta Isaías,
e o lobo e o cordeiro pastarão juntos
e a comida de ambos terá o mesmo



gosto de aurora.


Artigo VII.

Por decreto irrevogável fica estabelecido
o reinado permanente da justiça e da claridade,
e a alegria será uma bandeira generosa
para sempre desfraldada na alma do povo.


Artigo VIII.

Fica decretado que a maior dor
sempre foi e será sempre
não poder dar-se amor a quem se ama e saber que é a água

que dá à planta o milagre da flor.


Artigo IX.

Fica permitido que o pão de cada dia tenha no homem o sinal de seu suor.
Mas que sobretudo tenha
sempre o quente sabor da ternura.


Artigo X.

Fica permitido a qualquer  pessoa,
qualquer hora da vida,

uso do traje branco. 


Artigo XI.

Fica decretado, por definição,
que o homem é um animal que ama e que por isso é belo,
muito mais belo que a estrela da manhã.


Artigo XII.

Decreta-se que nada será obrigado
nem proibido, tudo será permitido,

inclusive brincar com os rinocerontes e caminhar pelas tardes com uma imensa

begônia na lapela.


Parágrafo único:

Só uma coisa fica proibida:
amar sem amor.


Artigo XIII.

Fica decretado que o dinheiro
não poderá nunca mais comprar
o sol das manhãs vindouras.
Expulso do grande baú do medo,

o dinheiro se transformará em uma espada fraternal para defender o direito de cantar e a festa

do dia que chegou.


Artigo Final.

Fica proibido o uso da palavra liberdade, a qual será suprimida dos dicionários e do pântano enganoso das bocas. A partir deste instante a liberdade será algo vivo e transparente como um fogo ou um rio, e a sua morada será sempre o coração do homem. 

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